
Se não escrevo nem quatrocentas e duas reportagens por SEMANA, é porque falta algo INDEFINÍVEL. “Vontade” talvez seja um bom chute. Mas às vezes alguns projetos passam por esse grande FILTRO que é a preguiça. São levados adiante. Em maio, decidi contar sobre o Futebol Clube Rio Pardo. Resumidamente, o FCRP, que pela sigla poderia até ser uma equipe formada pelos Relações Públicas com os quais nos PECHAMOS pelos corredores do 21, é o mais novo clube de futebol profissional do Rio Grande do Sul. Foi fundado em 27 de novembro de 2008, e neste ano entrou na Segunda Divisão do campeonato estadual.
Seria mais um nome na tabela da competição e ninguém falaria a respeito. Sempre é assim. Por isso, resolvi AGIR. Não pelo Rio Pardo, mas pelo PERIODISMO puro. Entre incontáveis coisas, a graça dessa profissão CASTRADA de diploma está na possibilidade de buscar o novo. Ir atrás daquilo que ninguém havia se ATINADO e divulgar uma história. Minha memória péssima me impede de saber quem PARIU essa frase, mas certa vez alguém disse que “um escritor é quem escreve coisas extraordinárias sobre fatos banais, e um jornalista escreve banalidades sobre coisas extraordinárias”. Penso que é possível buscar a dupla extraordinariedade – no aparentemente ordinário.
Quiçá o “jornalismo literário” no

Mais de uma dezena de ligações: para jornalistas locais, para a rádio da cidade e para o jornal de Rio Pardo e, finalmente, para os responsáveis pelo clube, ajudaram a construir um NORTE. Era tarde de uma quinta-feira quando obtive um número direto para contatar o senhor Tabajara Ramalho de Andrade, presidente do Rio Pardo, e marcar algo parecido com uma ENTREVISTA. Haveria jogo dali a dois dias, no sábado, e eu queria fechar a coleta de dados sobre o clube antes disso. Telefonei para Tabajara. Uma, duas, três, sete vezes. Do meio da tarde até a noite, a intervalos regulares e sem nunca ser atendido, tentei EM VÃO conversar com o homem. Às dez e meia da noite houve resposta. Questionei o VIVENTE do outro lado da linha se aquele era o número de Tabajara.
– Depende – disse-me ele.
Guardei para mim o pensamento PRECONCEITUOSO de que um atendimento daquela forma lembrava os estereótipos de CRIMINOSOS com medo de serem identificados, e mantive um diálogo. Sem saber se a pess

Às oito da manhã do sábado, o despertador do meu celular DECEPOU o que restava do meu sono e avisou: “se quer ir para Rio Pardo, acorde, CABRÓN”. Devo ter passado uma boa meia hora na cama, certo de que não precisaria fazer a viagem para ter um bom TEXTO, até concluir que deveria ESGOTAR as possibilidades de ENRIQUECER a reportagem. Levantei, me arrumei e botei uma mochila nas costas

Se nada disso tivesse acontecido e tudo fosse BROCHURA, restaria o consolo de que li umas cento e cinquenta páginas do LIVRETO de Sennett, durante uma longa viagem que só foi acabar às onze da noite, quando o ônibus me DESPEJOU novamente na Boca do Monte. No domingo, com fatos, fotos e CANTIGAS, sentei-me à frente do computador e me pus a digitar. Poderia escrever umas trinta páginas. Tentei não passar de SUPORTÁVEIS três. Sou absurdamente crítico com os meus textos, acho que NENHUM deles presta, mas aquele tinha a glória do esforço. Fiz a pauta, apurei, investi tempo e dinheiro próprios e saí com uma reportagem única. Garanto que não há nada mais completo sobre o Futebol Clube Rio Pardo – e só surgirá se algum dia o time virar uma VEDETE para a grande imprensa esportiva que, via de regra, só valoriza o interior quando seus times estão bem. Mesmo que não existisse um público disposto a CONSUMIR essas informações que ninguém mais se anima a pesquisar (e há), só a perspectiva de, daqui uns anos, os rio-pardenses interessados em saber como o seu clube iniciou encontrarem aquele texto já fez valer a pena.
É um exemplo do futebol, mas poderia ser de qualquer outra área. Essa é a ESSÊNCIA do jornalismo. E vale também para o DIA SEGUINTE. Com o passar dos meses, a situação do Rio Pardo ficou menos LUMINOSA. Por razões que nunca ficaram bem esclarecidas, o dinheiro RAREOU. Os jogadores, muitos dos quais chamam Tabajara hoje de “safado”, fizeram greve e exigiram a saída do presidente – e a prefeitura, que “não tinha” ingerência sobre o time, agiu decisivamente para tirá-lo de lá. Tabajara tornou-se enormemente impopular em Rio Pardo. Para se PREVENIR de ligações de torcedores furiosos, talvez tenha sido melhor continuar dizendo “depende” quando perguntado se seria ele mesmo ao telefone.
• A reportagem de Rio Pardo: FC Rio Pardo, cento e sessenta e quatro dias depois
• E o comentário sobre o que veio depois: Um estádio e as suas lendas (por Iuri Müller) e O treinador interrompido (por mim)
Maurício Brum.
2 comentários:
Tranqueira invicta! Maravilha!
Isso me lembrou Quintana, abordado na rua:
- O senhor é Mário Quintana?
- Às vezes...
Belo reportagem, Maurício!
Como sempre, Maurício, conseguistes transformar um fato corriqueiro em matéria de qualidade. Sou fã desses meus colegas. hahah :P
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